quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Mão amiga

Eu estava desiludido, maltrapilho, deitado no chão de barro. Os caminhões passavam jogando poeira em meu rosto, e as pessoas seguiam indiferentes às minhas feridas. Sem forças para chorar, em virtude da dor alucinante, vi brotar do peito um pássaro vestido de esperança, que levou a comovente súplica ao meu Senhor: “Pai, ajuda-me”. Nessa hora em que o corpo não era nada, alcancei pelas ondas invisíveis do amor a solidariedade de um irmão, que ao se aproximar disse: “não se turbe o vosso coração”. Relembrei, imediatamente, do Glorioso Rabi e da medicina celeste que Ele dedicou aos miseráveis, iguais a mim. Não pude conter a emoção e dos lábios surgiu o sorriso outrora escondido pelo sofrimento. A doce figura conduziu-me, e, quando acordei do sono profundo, estava numa casa simples, de uma energia benfeitora e perfumada pelo hálito da natureza. Deslumbrado com o clima maravilhoso, demorei a perceber que as minhas chagas haviam sido cuidadas, e o meu corpo estava limpo. Esboçando dificuldade, levantei dos lençóis brancos, que nada lembravam o leito de agonia e busquei o espelho. Quem estava ali? Não podia ser eu. Onde fora parar a pele suja, o cabelo emaranhado e os olhos tristes? Lembrei-me, então, da face angelical e do gesto solidário que me pôs no colo. Chorei ao lembrar a prece desesperada. A nobre alma aproximou-se e me envolveu em carícias de luz. Abracei-a com afeto. E ela parafraseou o adorado discípulo: “se eu tiver o dom de profecia, e conhecer todos os mistérios, e quanto se pode saber; e se tiver toda a fé, até a ponto de transportar montanhas, e não tiver caridade, eu nada serei”.

Um conselho inesperado

O sol brilhava, os casais de namorados aproveitavam o belo domingo, as crianças brincavam alegres e os senhores de cabeça branca se divertiam contando estórias do passado. Havia ali, naquela praça, uma atmosfera de paz. A natureza brindava a todos com um espetáculo de cantos, danças e cores. Os pássaros expunham as mais lindas melodias, as plantas bailavam, harmoniosamente, ao sabor dos ventos, e o arco-íris se refletia nas águas cristalinas do regato.
Profundo admirador da obra inigualável e magistral, eu observa cada gesto desta Mãe Divina, que aprendemos a chamar de natureza. Muito descontraído, então, vi um homem sentar-se ao meu lado e me desejar bom-dia. Retribui a gentileza e o reconheci com algum esforço. Era João, grande companheiro dos tempos de escola. Fixei os olhos nele para ter certeza e, quando tive, expressei a feliz surpresa dando-lhe um caloroso abraço.
A primeira pergunta que me acudiu foi a de indagá-lo como andava a vida. Ele, um pouco intranqüilo, respondeu-me: – não vai nada bem. Quis saber o motivo e, como precisasse desabafar, João me contou o seu problema: – o meu pai, antes de morrer, reuniu os 4 filhos para comunicar sobre o testamento que nos deixaria. Segundo a vontade dele, os bens seriam divididos em igualdade de valor. Pediu que, jamais, brigássemos por dinheiro e, com sabedoria, fizéssemos bom uso da herança. Hoje, após 5 anos de sua partida, posso dizer que fracassei diante do pedido final. Todos os meus irmãos investiram em ótimos negócios, tornaram-se grandes empresários, donos de carros luxuosos, apartamentos, casas de praia, lanchas... Enquanto, eu fracassei literalmente. A pequena fortuna, que tive em mãos, virou pó.
Ouvindo aquela prosa em tom de melancolia, não fiz questão de entender os detalhes, compreendi que a curiosidade só aumentaria a culpa de meu amigo; então, resolvi lhe falar de uma “Grande Alma”, que deixou enormes lições para Humanidade:
– No século XX, um homem franzino e infinitamente mais pobre do que nós dois venceu o Império Britânico e libertou o seu povo de um século de dominação. Sabe quais os recursos financeiros que ele tinha?
– Quais?
– Nenhum. Ganhou a guerra sem empunhar uma única arma, cativou as pessoas com o discurso da não-violência e exortou as consciências a lutarem pela justiça, fazendo uso da paz. Quando, enfim, esse homem conseguiu a independência de seu País, um radical religioso atirou nele fatalmente.Você imagina, João, o que ele pediu antes de morrer?
– Não.
– Que perdoassem o seu algoz! Quando você me falou sobre o patrimônio dos seus irmãos, me veio esta história à cabeça, porque eu nunca quis saber os caminhos para ter carros, apartamentos e lanchas. Na verdade, eu peço a Deus para levar desta terra a compreensão mínima deste amor, que de tão maravilhoso, chega ser difícil de explicar. O que dirá de sentir...

Com os olhos marejados e a voz embargada, João gaguejou: – Qual o nome deste homem? Antes de responder, fiz um pedido: – Pacifique o seu coração. O império invasor que lhe oprime é a culpa; enquanto o auto-perdão chama-se: Gandhi; ou melhor, Mahatma Gandhi. Não se esqueça disso, jamais. Procure conhecê-lo. 

Uma pergunta para um Evangelho de respostas


Os dogmas religiosos – repetidos à exaustão pelos sacerdotes ao longo das eras – não se renovam, insistem na idéia de punições eternas, criam castas de privilegiados, fazem das liturgias ensaiadas, da fé cega e do fanatismo as maiores bandeiras do verdadeiro cristão. Ignoram que Jesus disse ser o Evangelho a “pedra angular” de toda Escritura. Essa grande observação, se levada com seriedade, conduzirá o homem a indagar: o que confere aos textos apostólicos tamanha sublimidade, a ponto de um espírito iluminado (como Jesus) ter sido escolhido para ensiná-lo?

A primeira de muitas respostas:
         A ferida de um doente não pode ser exposta, outra vez, ao mesmo mal que lhe fez abrir, sob pena de aumentar a dor daquele já sofre.
O alcoólatra, na fuga do vício, recorre à terapia salutar e repete, como mantra, a fuga do primeiro gole; o dependente químico segue o mesmo caminho e busca vencer as sensações de vazio que lhe apontam, traiçoeiramente, o falso calmante; por sua vez, o apostador, em ruínas, recorre à família para pagar as dívidas e se isola dos ambientes de jogatina. Em todos os casos, há o pedido de socorro pela mão amiga, porque se vê no próximo, a palavra caridosa, o abraço amoroso e a companhia indispensável. A mente enferma, por instantes, esquece-se do desespero, dá ao homem são o poder de consolá-la e de resgatar uma máxima inabalável: “Em verdade eu vos digo que todas as vezes que fizestes isso (a caridade) a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes! (Jesus)”

A segunda de muitas respostas:

Aflitas por ideologias tirânicas, muitas pessoas sofrem como se a vida fosse fatalmente trágica. Há uma disseminação do medo, do pecado, da culpa e da morte, esquecendo-se que o Criador não destrói as suas criaturas, apenas, transforma-lhes a aparência, assim como faz com todas as formas de vida da natureza. É chegado o momento de a Humanidade sair deste inferno – não o lugar mítico, cuja existência contrariaria a infinita bondade de Deus – mas, o estado de consciência; porque o inferno, propriamente dito, é a nossa mente, que de tão maltratada, aprisiona-nos em senzalas internas, no submundo dos pensamentos e impede que vejamos “os lírios do campo e as aves do céu”, conforme pediu o Nosso Senhor. Deus é saúde, prosperidade, amor incondicional, virtudes incontáveis... São os homens que se fazem sofrer. Por que tanta culpa e judiação sobre a dádiva da vida? Jesus aconselhou-nos: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei (...) porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”.

A terceira de muitas respostas:

O mestre, apenas, ensina ao discípulo aquilo que, verdadeiramente, pode ser aprendido e praticado; caso contrário, haveria perda de tempo, na prática de um exercício inútil. No Sermão da Montanha, Jesus provocou estesia na multidão ao ditar a mensagem de todos os tempos, exaltando as virtudes que conduzem aos Céus. “Bem-aventurados os brandos, porque possuirão a Terra. Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus.”

A quarta de muitas respostas:

Ninguém domará os vícios da língua, do corpo e da mente, a fim de iluminar a alma, porque alguém lhe disse sobre a importância desses atos. Como bem ensinou Jesus, “é preciso ter olhos de ver e ouvidos de ouvir”; não segundo o corpo, que esbarra na dureza da matéria, mas conforme o espírito que se sensibiliza perante as mensagens celestes. “Amai uns aos outros” é a lei régia da vida, compromisso primeiro de toda criatura, porém a máxima tem sido relegada por alegorias perversas para evolução moral, como o comércio da fé, a segregação entre os homens e a censura ao direito inalienável de se chegar ao sagrado da maneira que, pessoalmente, melhor tocar o coração. O Evangelho, antes de tudo, é um serviço íntimo, de luta pelo autoconhecimento, que no ápice de sua forma, nos permitirá ver o Cristo em cada semelhante. Não basta bradar falsas virtudes e rezar em ambientes públicos. Jesus pediu: “mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê, em secreto, te recompensará”. Seguindo a instrução, o Mestre completou: “orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que por muito falarem serão ouvidos”.

A quinta de muitas repostas, preenchida, desta vez, com duas perguntas:

     Por que o número de templos religiosos se multiplica, e as tragédias sociais acompanham o mesmo ritmo? Será que passados 2013 anos, realmente, compreendemos a mensagem de Jesus?

Apresentação

As mensagens compartilhadas, neste blog, têm por princípio uma visão humanista da vida, na qual o ser pensante é respeitado em toda a sua complexidade (física e espiritual). O elemento escolhido para essa missão é a palavra, utilizada como um signo de amor, capaz de erguer a bandeira da fé sobre a rocha do conhecimento. Observadores da vida que somos, vemos a terra como um lugar de enfermidades, brigas e maledicências de toda ordem, e acreditamos que na prática do bem é possível modificar essa realidade. Instruído, o homem desperta a sua consciência divina, assume deveres na civilização e torna-se um potencial médico das almas. Sob o lema da compaixão, qualquer pessoa será muito bem-vinda neste espaço, independentemente, de suas ideologias. A troca de idéias, em círculos sociais, aproxima os indivíduos; a comunicação faz os conceitos “de verdade” se encontrarem, e o psiquismo, antes limitado nas trincheiras pessoais, enxerga “mundos” desconhecidos (novas opiniões), capazes de mudar algo que parecia consagrado no inconsciente popular.

O desafio, por aqui, está na capacidade de substituir os resquícios de intolerância, discriminação, segregação e violência de qualquer raiz, a fim de lhes dar outra face, mais nobre.  A literatura presente é um toque de sensibilidade que visa o íntimo dos leitores, convidando-os a uma reflexão racional da espiritualidade, sem desprezar a natureza dos sentimentos. Eis o ponto mister desta apresentação: um palco para o diálogo elucidativo, digno de unir peças-chaves na evolução humana: as inteligências emocional e psíquica. Acredita-se que o autoconhecimento é a fonte primordial de todas as descobertas espirituais, o antídoto da ignorância, do fanatismo e do medo, o fim do apartheid entre as diferentes crenças. O homem que, verdadeiramente, visita a própria consciência, reconhece suas fraquezas e se medica com a terapia necessária nos rumos da maturidade psicológica. É passado o período em que os questionamentos existenciais eram respondidos à sombra do misticismo e de dogmas autoritaristas que sufocavam a evolução. Somos frutos da matéria-prima do pensamento de Deus, porém as nossas maiores virtudes ainda adormecem no caos dos dias. O sujeito religioso se afasta da ciência porque permite a falsos sacerdotes cumprirem um papel intransferível, o de intérprete de suas vidas; inclusive, no entendimento das revelações espirituais. Mesmo na fé, é preciso pensar. Entregar-se às emoções sem as luzes da razão, torna-nos seres incapazes de submeter as “verdades” que nos habitam a uma avaliação para mantê-las ou substituí-las.