Ajoelhado, o menino buscava conforto para
as suas dores. Os olhos infantis fitavam a imagem do Cristo, encostada na
parede, e derramavam gotas de esperança nas páginas do Evangelho de Mateus.
Nenhuma palavra, naquele instante, podia ser ouvida. A criança, em profunda
meditação, recorria ao silêncio. Surpreendentemente, o pequeno filho de Deus
suportava as misérias que o assolavam sem murmurar uma única queixa. Quando,
enfim, abriu os lábios, leu com a mesma voz cândida, que sempre recorria ao
Pai-Nosso: “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados...”. Antes
de se levantar, a pequena criatura, de semblante renovado pela prece, bebeu a
água iluminada por seus mentores espirituais.
Ao
sair do quarto, que dividia com seu irmão, ele procurou a porta da rua e foi
para praça brincar. Com a bola presa entre o corpo e as mãos, caminhava até o
campinho de futebol. No meio do percurso, a terna alma deparou-se com uma jovem
tristonha e solitária, sentada no banco de concreto da paisagem urbana. Como se
pudesse mensurar em seu próprio peito o sofrimento alheio, o nobre amigo
cumpriu mais uma etapa de sua admirável jornada. Recordou-se da cena em que
Jesus perguntara a Maria de Magdala: “Mulher, por que choras?”, e se aproximou com intuito
pueril, ciente de que era, tão-somente, mais um entre tantos colaboradores da Estrela de Nazaré.
O
franzino e meigo camarada sentiu por aquela moça, na plenitude da vida física,
um amor cujos homens adultos não poderiam entender. Ele se aproximou e através
da mediunidade enxergou um longo estado de depressão. Apesar da beleza
indígena, faltava brilho a jovem. Suas bochechas eram pálidas, o cabelo sem
viço e os olhos – ah, os olhos! – pareciam sem vida. Com duas balas no bolso, o
menino ofereceu uma à bela cabocla. Ela aceitou, agradeceu e perguntou-lhe qual o seu nome? Explicativo, ele
respondeu: “Pedro, e foi a minha mãe quem escolheu”.
- Muito bonito, elogiou a jovem.
Agora, feliz pela oportunidade de falar
àquele coração, que se mostrava receptivo, Pedrinho conversou feito gente
grande:
-
Assim como você se sente, eu também me sinto. Dói muito a sensação de estar só, mesmo quando acompanhado por uma
multidão, mas há nisso uma oportunidade santa para nos conhecermos melhor. Há
tempos, deixei de me lamentar. Não posso viver contra a minha natureza, a fim
de agradar os outros. Prefiro agradá-los por intermédio do amor. Muitas pessoas
dizem que preciso conhecer o mundo, passear, freqüentar festas e lidar com
gente da minha idade. E eis que eu sempre replico: apresentem-me os depressivos, os desesperados, os que curtem as
dilacerantes misérias da alma e, assim, vocês não só me ajudarão a conhecer o mundo, como também a modificá-lo. Não quero
fugas!
A jovem recebeu o conforto da mensagem
inesperada e se identificou, profundamente, com a filosofia que relatava a
pureza e a sabedoria de uma criança. Menos tímida, ela retirou o espinho do
medo, que lhe sufocava a auto-estima e resolveu falar:
- Perdi o ânimo de viver. Não tenho motivação
para nada. Nem da minha aparência cuido mais. Fico em casa, presa a uma
vontade, sem-fim, de me isolar. Cansei da paisagem que não muda, das pessoas
que dizem sempre a mesma coisa e da falta de acontecimentos novos.
Pedrinho lamentou o clima sombrio que a
envolvia, foi ameaçado por alguns pensamentos a recuar e abandoná-la ali, na
amargura. Num gesto de doçura, o menino ignorou a má sensação e pegou a mão da
jovem. Estava gelada e o pulso, agitado. Olhando-a, fixamente, ele pediu
atenção para, em seguida, levá-la às lágrimas:
- O materialismo não
lhe basta. Você pode buscar refúgio no consumo de roupas, jóias e na busca de
grandes paixões, mas não encontrará. Neste exato segundo, ressoa dentro do seu
íntimo o eco do mundo invisível.
Surpresa, a linda cabocla questionou: - como
sabe o que sinto?
Pedrinho lhe saciou a dúvida: - Eu também
vivo esta situação. Passado tanto tempo, aprendi que preciso ter paciência. A
dor será superada. Não posso deixar o pânico invadir a minha mente. A série de
ataques espirituais nos ensina a ter autocontrole e a redobrar o ímpeto nos
caminhos da fé. O médium, em prova, é submetido ao estresse. Se ele não põe
prazo para as dificuldades se afastarem e luta - sem desespero, com os recursos
do amor, a vitória, certamente, virá. Quem aprende a se conhecer, cria forças
para servir aos semelhantes no terreno da caridade. É simples assim, não se
espante! Doamos aquilo que temos. E feliz aquele que descobre a paz dentro de
si, porque terá, sempre, uma palavra de conforto para doar.
- Tenho perdido noites de sono inteira por
não conseguir me concentrar. Os meus pensamentos parecem saturados, não sei
mais o que dizer a mim mesma, contou a jovem.
Pedrinho retornou a fala: - É você, em
espírito, quem grita; e o seu corpo, conseqüentemente, sofre movido por uma
grande sensibilidade, que o faz captar até “o vento que passa”. Por favor, não
se desespere. Enquanto, muitas perdem a saúde brigando por riquezas e poder, a
sua delicada alma clama e pede a oportunidade de se dedicar ao amor. Creia em
Deus! A hora está próxima e você há de encontrar a bênção que tanto pede.
A moça abraçou o menino
como se ele fosse o seu próprio filho e acreditou que aquela linda mensagem
abriria os seus caminhos espirituais.
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