Se
eu pudesse, escolheria jamais ser ofendido, simplesmente, porque machuca e dói
muito. No entanto, o serviço maior não é o de evitar a ofensa; isto vai além
das nossas forças. O esforço central nos exige o controle dos sentimentos, para
vibrarmos em direção oposta ao mal, livre do seu intuito.
O verbo agressor fere a
intimidade, retira a calma e apresenta à vítima, que opta pela cólera, um
labirinto de ilusões espirituais. Os efeitos do insulto atingem a alma
desprevenida maculando a vaidade sensível ao toque, e o amigo, antes, inseparável torna-se, então, o maior dos
desafetos. Em desalinho, as emoções recebem cargas excessivas de ódio, difíceis
de serem drenadas pela frágil estrutura humana. Débil, a vítima ignora a
terapêutica do perdão e migra do estágio de oprimida para o de opressora. Triste
assimilação das provas terrenas!
“Fiz tudo o que podia. Fui mais do que um irmão. E ele me traiu”. O discurso de quem se julga injustiçado é quase sempre o mesmo. Os círculos sociais estão impregnados pelo processo de auto-vitimização. As pessoas criam e aceitam a idéia de que o mundo está perdido, como se elas fossem uma flor perfumada, exalando amor, no ambiente hostil de um pântano, cheio de predadores famintos. É preciso encarar a realidade: não somos tão generosos quanto acreditamos ser. Lidamos o tempo inteiro com a dualidade profética entre paraíso e inferno que nos faz oscilar enquanto formos leigos de nós mesmos.
Quem não alimenta, em si, a vontade de atacar enfrenta, com a auto-estima radiante, qualquer ofensa, sem a necessidade de retribuir a pedrada com outra ainda mais forte. A bondade é virtude adquirida por méritos. Obviamente, que nas mais simples discussões, temos o desejo frívolo de sobressair; no entanto, se assim for, jamais teremos o desafio real para exercitar a paciência e a humildade.
Todos nós,
indistintamente, suportamos os percalços impostos pelo orgulho. Ainda hoje, vemos,
na figura do próximo, ações exploratórias para conosco. Julgamo-nos
injustiçados, como se todo mundo que chegasse ao nosso portão viesse por
interesse, sem nenhum resquício de amizade. Pensando assim, ignoramos as vozes do Pai Nosso. Cremos
ser possível alcançar o perdão isento da responsabilidade de perdoar. Por
indescritível misericórdia, Deus sempre enviou a Terra espíritos evangelizados
para nos lembrar das mensagens de Jesus. Neste intuito, São Francisco de Assis,
caminhando entre os pobres, ensinou a cura espiritual através do grito
arrebatador, que brota na alma, e nos diz: sejam piedosos.
Não importa se as pessoas queiram nos usar. No fundo, essa percepção
utilitarista é um reflexo ilusório da vida material. Antes de sermos utilizados
por alguém, estamos servindo ao Criador. O homem que ergue a sua auto-estima
jamais se considera uma ferramenta descartável; pelo contrário, bem diz os Céus
pela oportunidade de ser útil. Mesmo que o beneficiado haja, posteriormente,
com ingratidão, não devemos nos desiludir. O bem foi semeado, luzes se acenderam
e o nosso coração ficou um pouco melhor do que antes. A caridade jamais é em
vão.
Urge na modernidade o
desafio de provocar sensações novas nas pessoas. O amigo infiel e interesseiro
espera o revide pela traição, ou no mínimo, milhões de ataques verbais e
desejos sombrios. Por que não fazer, justamente, o inverso? A compaixão é uma força
indomável da Natureza. Em vez de se regozijar com a ira do mais novo inimigo, a
criatura ingrata será levada à reflexão: “que sujeito é esse que, apesar da minha
sordidez, sempre me acolhe com generosidade?”.
Não digo que a
empreitada será fácil e repleta de êxitos, contudo não podemos negá-la. Devemos
o exercício do bem a nós mesmos. Se em 10 tentativas de plantar o amor falharmos
em 9, não há problemas. A única vitória já valerá por mil. Os espíritos puros
cantam quando uma alma se volta para Deus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário